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Isto é Eurovisão - Grécia 1974

28/08/2014 por Gonçalo Coelho

O Festival Eurovisão da Canção 1974 decorreu no dia 6 de abril, na cidade britânica de Brighton, uma localidade costeira que, na época, estava na moda devido às praias, ao entretenimento cultural e noturno e ao rápido crescimento urbano. Era mesmo considerada o “Algarve inglês”.

Contudo, esta edição do Festival não deveria ter sido realizada no Reino Unido, visto que foi o Luxemburgo a vencer o certame no ano anterior. No entanto, isso faria com que a RTL tivesse de organizar dois Festivais de seguida, o que pesaria bastante no orçamento da estação e, por conseguinte, no do grão-ducado. Assim, a BBC aceitou o convite da UER para organizar o concurso, voltando a exercer o papel de “bombeira de serviço”, tal como o fizera em 1960, 1963 e 1972. O local escolhido foi o Brighton Dome, um conjunto de três auditórios mandados construir pelo rei Jorge IV, no século XIX.

Em competição estiveram 17 países, o mesmo número de inscritos de 1973. A Grécia estreou-se no certame, enquanto a França se viu forçada a sair do concurso poucos dias antes de este ter lugar. O país tinha inclusivamente uma intérprete, Dani, e uma canção, "La vie à vingt-cinq ans”, mas a morte do então Presidente francês, Georges Pompidou, a quatro dias do evento levou a ORTF a optar por se retirar do Festival. Ainda por cima, as cerimónias fúnebres do mítico político ocorreram no mesmo dia da Eurovisão. A mesma razão impossibilitou a francesa Anne-Marie David, vencedora em 1973, de vir passar o testemunho aos seus sucessores.

A gala teve a condução de Katie Boyle, uma veterana nesta função, pois apresentou o ESC em 1960, 1963 e 1968.

O momento de intervalo foi preenchido com um vídeo da banda The Wombles, um conjunto de músicos mascarados como as personagens da série infantil com o mesmo nome. O grupo resiste até hoje. Foi um momento divertido e original, quebrando a linha clássica da emissão.

O método de votação é que foi motivo de verdadeira tensão entre as várias delegações nos momentos que antecederam o Festival. Era suposto que a votação se desenrolasse do mesmo modo que nos dois anos anteriores (mas em vez de dois jurados, estariam 10 pessoas de cada país a pontuar cada tema de 1 a 10 pontos). Contudo, a cerca de 48 horas da emissão, a BBC mudou completamente o sistema de votos – assim, cada país teria 10 jurados, cada um deles dispondo de um voto para dar ao seu tema preferido. Era, basicamente, um retorno ao regulamento que vigorou até 1970.

 

A VENCEDORA

Estamos perante a mais bem sucedida canção vencedora de sempre. A banda sueca ABBA catapultou-se para a fama depois de ter ganhado a Eurovisão com o tema “Waterloo”. A canção, interpretada totalmente em inglês, recebeu 24 pontos – uma pontuação modesta, provocada pelo sistema de votação em vigor, não dando espaço até para uma grande margem – apenas seis pontos a separaram da segunda classificada, a Itália. Portugal deu-lhe apenas um ponto; o Reino Unido não a pontuou.

A canção é um marco na história da Eurovisão, tendo sido a responsável pelo fim de uma época mais clássica e pela abertura à cor, ao espetáculo, à irreverência. As vitórias dos Festivais seguintes corroboram esta ideia – e todas as vitórias suecas seguiram esta linha.

Depois da vitória em Brighton, “Waterloo” subiu até ao primeiro lugar nos tops de muitos países, tendo mesmo chegado ao top 10 nos Estados Unidos! Vendeu mais seis milhões de cópias e foi considerada, em 2005, a melhor canção de sempre da Eurovisão.

 

PORTUGAL

Portugal fez-se representar por Paulo de Carvalho, que finalmente vencera o Festival depois de ter participado em 1970, 1971 e 1973. A canção escolhida, “E Depois do Adeus”, tem letra de José Niza e música de José Calvário. Ao contrário das últimas canções portuguesas no certame, esta não tem substanciais referências políticas, sendo (mais) uma canção de amor.

Na Eurovisão, ficou em último lugar (juntamente com Noruega, Suíça e Alemanha) com apenas 3 pontos, dados pela Suíça e Espanha, os eternos salvadores do orgulho nacional no Festival.

Pessoalmente, acho este um dos temas mais fracos e desinspirados que levámos à Eurovisão. Há gostos para tudo…

 

CURIOSIDADES

Nesta edição houve três regressos:

Os noruegueses Bendik Singers estiveram em 1973 na Eurovisão, mas na sua segunda participação, que contou com Anne-Karine Strøm como vocalista principal, não ficaram muito bem classificados: passaram de 7º para 14º.

Romuald voltou pela terceira vez ao Festival – foi pelo Mónaco em 1964, pelo Luxemburgo em 1969 e voltou a representar o principado em 1974.

Gigliola Cinquetti, a grande vencedora da Eurovisão de 1964, regressou e apresentou-se mais bela e madura (e igualmente nervosa). A sua participação no concurso não foi um mar de rosas: a sua atuação não foi vista em direto pelo público italiano, pois a RAI considerou que o seu tema, “Si” (Sim, em português), era uma sugestão para que os italianos escolhessem essa opção no referendo sobre o divórcio que haveria daí a um mês.

Ireen Sheer, representante luxemburguesa, voltaria ao certame em 1978, pela Alemanha, e em 1985, novamente pelo Luxemburgo.

Tina Reynolds, da Irlanda, já poderia ter pisado o palco eurovisivo em 1973, quando foi chamada pela RTE para ir até ao Luxemburgo substituir a intérprete desse ano, Maxi, que ameaçou não cantar na gala. Tudo se resolveu pelo melhor, e Tina foi convidada para ir ao ESC1974 como forma de compensar o incómodo.

Não foi só pela música que a Suécia se destacou: o seu maestro, Sven-Olof Walldoff, foi vestido a Napoleão Bonaparte, numa alusão à batalha de Waterloo, que dava nome à canção.

Apesar do sucesso inigualável de “Waterloo”, a canção não constava dos favoritos iniciais. Esses eram o Reino Unido, representados pela conhecidíssima Olivia Newton-John, o Luxemburgo e a Holanda. Os suecos ganharam terreno nos ensaios.

Olivia Newton-John acabou por confessar mais tarde que não gostava do seu tema, “Long Live Love”, com o qual terminou em 4º lugar.

A Grécia fez a sua primeira participação com a cantora Marinella. Assinalaram-se este ano quatro décadas desde esse acontecimento. Curiosamente, a canção grega do 40º aniversário alcançou o pior resultado do país – 20º lugar. Como forma de homenagear a primeira entrada grega, a cantora Helena Paparizou vestiu uma blusa semelhante àquela usada por Marinella durante a final do Melodifestivalen 2014, onde concorreu com o tema “Survivor”.

A canção belga, cantada por Jacques Hustin, intitulava-se “Fleur de liberté”, que permite estabelecer uma analogia interessante com o cravo, a flor da liberdade em Portugal, que saiu às ruas dias depois da Eurovisão.

E Depois do Adeus” não fez história no quadro de pontuações, mas é a única canção eurovisiva a estar também nos livros de História: foi a primeira senha utilizada a 24 de abril de 1974 para colocar os militares a postos para saírem à rua, na decisiva missão de derrubar o Estado Novo.

Na delegação portuguesa esteve o conhecido apresentador Carlos Cruz, responsável pela editora de Paulo de Carvalho, que assumiu o mesmo papel em 1972. Artur Agostinho foi o comentador para a RTP.

Perante as modificações inesperadas no modelo de votação, a equipa portuguesa ponderou mesmo desistir da competição.

Nesta edição, continuou a ser possível os países escolherem livremente o idioma em que interpretavam as canções. Finlândia, Noruega, Suécia e Holanda cantaram em inglês, tendo a delegação portuguesa tentado fazer o mesmo, mas sem o apoio da RTP.

Peret, o representante espanhol nesta edição com o tema "Canta Y Sé Feliz", faleceu na passada terça-feira, vítima de um cancro no pulmão. Peret foi um dos maiores artistas espanhóis, com uma carreira que atravessou seis décadas e várias gerações. Tinha 79 anos.

 

CANÇÃO DE DESTAQUE

A Eurovisão tem uma característica que a torna única: é uma autêntica montra para que países, culturas, línguas, sonoridades e artistas se cruzem e se apresentem ao público. No meio de um desfile de baladas clássicas ou de canções pop enérgicas, também sabe bem ouvir uma canção genuína e única, que nos faça viajar por três minutos para o país de onde essa canção vem.

É o que acontece com este “Krasi, thalassa kai t'agori mou”, interpretado por Marinella, uma das rainhas do mundo artístico helénico. A canção começa com o fantástico som produzido pelo bouzouki, e logo aí somos conduzidos para as ruas de Atenas. O coro traz vivacidade, e Marinella empresta o seu sorriso e profissionalismo à canção.

A letra retrata alegria e simplicidade. A cantora diz que, para ser feliz, só precisa de “um pouco de vinho, um pouco de mar e o meu namorado”. Porque as coisas simples são as melhores do mundo.

A música é de Giorgos Katsaros e a letra de Pythagoras (até o nome do letrista é do mais tipicamente grego possível!) Obteve sete pontos e o 11º lugar, o que é pouco para uma canção que marca a diferença.

Parabéns à Grécia pelos 40 anos de Eurovisão. Venham muitos mais!

 

As minhas pontuações para este tema são as seguintes:

Letra – 8

Música – 10

Interpretação – 10

Apresentação em palco – 9

Visual – 9

Sensualidade – 5

 

1964 - Espanha|1974 - Grécia|1984 - Holanda|1994 - ?|2004 - Chipre|2014 - ?

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