Festivais da Canção entrevista Tozé Santos
24/02/2014 por Carlos Portelo
Tozé Santos concedeu-nos a seguinte entrevista como compositor e autor da canção nº9 Coração de filigrana. Agradecemos a Tozé Santos a disponibilidade e colaboração.
Festivais da Canção – Ficou surpreendido com o convite da RTP para participar no FC deste ano?
Tozé Santos - Sim, confesso que sim. Já tinha sido convidado há 2 anos. Só é sinal que o meu trabalho foi considerado válido e que continuo a dar cartas no cenário e provas de valor, face a quem decide nestes âmbitos. Sinto-me lisonjeado por tal.
FC – Como também é o autor do poema por favor referir sobre o que fala a sua canção.
TS - A canção refere-se de uma forma transparente a alguém do nosso país que, por necessidade, tem de emigrar em busca de melhores condições de vida. Parte com saudade mas com vontade de regressar. É um pouco o ciclo em que vivemos. No passado a emigração era uma prática recorrente, neste momento voltou a ser de novo uma necessidade emergente.
FC – Fale-nos dos motivos que o levaram a escolher Madalena Trabuco para interpretar o seu tema?
TS - Existiam 3 candidatas a interpretar a canção em questão. A Madalena preenchia todos os requisitos e mais um, o de ter esta vontade de regressar a Portugal. Penso que é quem mais sente o teor exposto no poema...
FC– Já tinha esta canção feita ou compô-la propositadamente para o Festival?
TS - O tema foi escrito propositadamente para o efeito. Muito embora já tenha começado a escrever a linha melódica há mais tempo, a letra foi “desenhada” a pensar no espírito do Festival.
FC – Esta canção aproxima-se, afasta-se ou é uma rutura em relação às que habitualmente compõe para o seu próprio reportório e à que apresentou no Festival da Canção de 2012?
TS - Penso que tem muito a ver com as minhas composições na sua génese. Não tem, no entanto, muito a ver com o que foi apresentado em 2012.Espero que o arranjo e a interpretação venham a fazer jus à carga emotiva que se pretende.
FC – Como vê o método de apuramento da nossa canção para o ESC, isto é, 100% televoto sem restrição do número de chamadas?
TS - Acho que, ainda assim, deveria haver um júri conhecedor e entendido na matéria com a sua cota-parte de poder decisivo, mas quem manda é a RTP. Confio no seu método de escrutinio, entidade esta que já experimentou várias formas e métodos. Eles saberão o que é ou pode ser mais fidedigno.
FC – Quem irá ser o estilista que vestirá a sua intérprete para a noite do Festival?
TS - Esta matéria está nas mãos da equipa que trabalha com a RTP. Ainda não podemos avançar com os nomes em cima da mesa, brevemente fá-lo-emos ;)
FC – Como será a apresentação em palco da sua canção? Tem alguma coreografia/ marcação própria?
TS - O que posso avançar neste campo é que irei acompanhar a minha interprete, não como vozes, mas como músico – guitarra. A composição é “low-profile”, de ambiente “acústico” e, como tal, defendo a minha presença, uma vez que a Madalena também faz questão.
FC - Quem serão os elementos de palco que acompanharão Madalena Trabuco em palco e que funções desempenharão?
TS - Como referi, provavelmente seremos apenas eu e ela.
FC – Na apresentação da sua canção em palco poderemos ver algum efeito cénico especial?
TS - Para já só sei que a equipa da RTP está a trabalhar esse pormenor com todas as canções / equipas / criadores e interpretes. A partir de dia 01 vamos tentar, em ensaio, várias soluções.
FC – Que expectativas tem para a sua canção neste Festival?
TS - Obviamente que a classificação é o barómetro que mede o sucesso da canção. Mas, mais que isso, só pretendo que a faixa seja respeitada e que tenha bom feedback e resultado nas carreiras, quer a minha, quer a da Madalena, que pretende “furar” em Portugal, com o seu próximo álbum.
FC – O Festival da Canção comemora 50 anos. Por favor escolha uma das seguintes 3 opções como a mais correta para si:
A) O Festival da Canção é uma marca importante da RTP
B) O Festival da Canção extravasa a própria RTP, sendo uma referência nacional.
C) Uma marca a descontinuar.
TZ - Sem dúvida a opção B. Qualquer que seja o músico, criador ou intérprete; ninguém terá ficado indiferente à história que o Festival deu à música de todos os tempos. Muito se conjectura em relação a isso, mas é do domínio público o termo “festival da canção”, tendo a sua própria valência e mérito.
FC – Como vê o atual panorama musical em Portugal quando muitos músicos e cantores estão sem trabalho?
TS - Vejo que está de muita má saúde e a piorar. Cabe aos músicos procurar novas soluções e formas de subsistência e de sobrevivência. Já não se pode falar de uma “indústria”, mas sim de um “artesanato” da música em Portugal. Já não se pode pensar numa carreira a longo prazo, mas sim no imediato, para se saldar dívidas e pagar contas. É triste que assim seja, mas a cultura é o segmento menos considerado hoje em dia, quando no dia-a-dia, as pessoas consomem desta fonte, só que a pensar que devem fazê-lo de borla, esquecendo quem precisa de viver “disto”...
FC – Fernando Tordo abandonou o país rumo ao Brasil face ao exposto na pergunta anterior. Quer comentar?
TS - Quero, pois. Fico sensível a que isto aconteça e comece a ser redundante. Tenho muitos amigos, muito e cada vez mais a fazê-lo.Eu próprio, conhecendo o resto do mundo como conheço, começo a pensar a sério em ir pregar para outras comunidades onde vejo ser mais considerado, remunerado e acarinhado. Por cá só vão dar pela nossa falta quando já estivermos instalados bem longe.
FC – O facto de não existir em prime time um programa musical com cantores profissionais, com exceção para as imitações não contribuirá fortemente para o desempregos dos nossos cantores e músicos?
TS - Voltamos a referir o termo descontinuado “Indústria” da música. Os programas que cita não são de todo focados em carreiras de artistas, mas na intenção de ter shares e de gerar e gerir orçamentos. Tudo o resto é periférico, e depois cabe aos artistas saber ou não gerir o problema que tiverem “comprado” com esses 15 minutos de fama.
FC – Quando existem cantores profissionais sem trabalho justifica-se existirem concursos para novos talentos?
TS - Sem querer fazer uso do sarcasmo, hoje já estão abaladas as fronteiras que dissociavam os músicos profissionais dos amadores; os aspirantes dos ilustres; os efémeros dos reincidentes... Os programas proliferam porque são fórmulas importadas e que trazem já provas de valência. Quem sou eu para desacreditar que se deva continuar a busca por novos talentos? Mas também se tem assistido a programas de televisão deste género aos quais concorrem e ganham artistas com décadas de carreira, por tanto acho que o problema não são os programas em si, mas a forma como são concebidos.
FC – Este espaço é para a sua canção diga o que pretender sobre ela e toda a equipa.
TS - Eu quis que esta canção tivesse uma razão de ser e não fosse apenas e só um trecho com o propósito de vencer por vencer. Estou a tentar fazer passar este sentimento a todas as pessoas envolvidas no processo e desejava, acima de tudo, que o tema ficasse para os anais da história, não só do Festival da Canção, mas da música Portuguesa contemporânea. Obrigado pelo espaço de entrevista, bem hajam, bom trabalho!